Como assinalamos no artigo Mateus 16:18 nos Padres da Igreja, os primitivos mestres cristãos não concordaram unanimemente na interpretação destas palavras do Senhor. A interpretação maioritária entre os antigos era que a pedra se referia à fé de Pedro, expressa na confissão que, por revelação do Pai, acabava de fazer.
Acrescento as seguintes observações de Hans Küng:
Deve lembrar-se neste contexto que a passagem capital de Mateus 16,18s, tão capital para os atuais bispos romanos que agora adorna com grandes letras negras sobre fundo de ouro a Basílica de São Pedro, não aparece nem uma só vez no seu texto pleno em toda a literatura cristã dos dois primeiros séculos; a passagem é citada pela primeira vez no século II por Tertuliano, mas não aplicada a Roma, mas a Pedro; só em meados do século III, um bispo romano, Estêvão II – um precoce exemplo do autoritarismo romano que opera sobretudo com excomunhões e vituperou o grande Cipriano como pseudoapóstolo e pseudocristão - se referiu para a melhor tradição ao superior nível de Pedro; mas só a partir do século IV usou-se Mt 16,18s (especialmente pelos bispos romanos Dámaso e Leão) para apoiar uma pretensão de primado, ainda que sem a pretensão formal de infalibilidade; finalmente, em toda a exegese oriental de Mt 16,18s pensa-se até para lá do século oitavo, no melhor dos casos, num primado pessoal de Pedro, sem que se tenha seriamente em conta a referência ao primado romano. E, seja como for, nem no Ocidente nem no Oriente se pretende a infalibilidade do bispo romano com referência a Mt 16,18s ou a Lc 22,32.
Hans Küng, ¿Infalible? Un interrogante. Barcelona: Herder, 1971, p. 128-129; negrito acrescentado.
Também, J.I. von Döllinger observou que “De todos os Padres que escreveram comentários sobre Mateus 16 e João 21, não há nem um só que aplique estes textos aos bispos romanos como sucessores de Pedro” (Döllinger: O Papa e os Concílios, p. 91).
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.