domingo, 28 de outubro de 2018

Não há autoridade que não proceda de Deus


Está escrito: "Todo homem esteja sujeito às autoridades superiores; porque não há autoridade que não proceda de Deus; e as autoridades que existem foram por ele instituídas. De modo que aquele que se opõe à autoridade resiste à ordenação de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos condenação". (Romanos 13:1-2)

Portanto, não importa absolutamente nada se num país existe uma república ou uma monarquia, uma democracia ou uma ditadura, nós somos chamados a sujeitar-nos à autoridade instituída. Obviamente, no caso da autoridade nos ordenar a desobedecer a Deus em alguma coisa, nós somos chamados a desobedecer à autoridade para agradar a Deus. Mas isso nunca nos deve induzir a entrar em lutas sociais ou políticas ou armadas ilegais contra a autoridade instituída por Deus para instaurar uma democracia ou uma monarquia, porque isso significa resistir à ordenação de Deus. Se, portanto, parte da população, fora da lei, começar com lutas sociais ou políticas ou armadas para instaurar ou restaurar algum regime político, os cristãos não devem de modo algum participar nelas, porque essas lutas não fazem parte da vontade de Deus para nós. Somos filhos do Rei dos reis, não revolucionários ou guerrilheiros.

sábado, 27 de outubro de 2018

A brutal injustiça do aniquilacionismo e do universalismo


No aniquilacionismo todos os homens que não forem salvos sofrerão a mesma pena, isto é, a aniquilação eterna, a passagem à não-existência. Não há qualquer tipo de gradação. Todos acabarão da mesma forma.

É como condenar à mesma pena um pilha-galinhas e um violador e assassino de crianças.

O mesmo se aplica ao universalismo, isto é, a teoria que defende que no fim todos os homens serão salvos. Todos também acabarão da mesma forma, independentemente do que fizeram em vida. O universalismo despreza por completo a justiça. 

É como decretar a impunidade geral para todos os homens.

O paradoxo do amor de Deus


Deus ama-me porque eu aceito o seu amor. Mas eu aceito o seu amor porque ele me amou primeiro. Esse é o paradoxo.

quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Sobre o anonimato dos Evangelhos


É popular afirmar que os evangelhos inicialmente circularam anonimamente, mas aqui estão algumas das razões para pensar o contrário:

- Havia vários evangelhos e documentos semelhantes a circular já em meados do século I (Lucas 1:1-4; para evidências de que Lucas foi escrito em meados do século I, ver https://triablogue.blogspot.com/2016/12/more-reason-to-date-synoptics-and-acts.html). Havia uma necessidade de distinguir esses documentos. A prevalência, a partir do século II, da distinção entre eles por meio dos nomes dos autores, acompanhada de nenhum meio concorrente de distinção entre eles, sugere que eles estavam a ser distinguidos pelos nomes dos autores já em meados do século I.

- Embora não houvesse necessidade de identificar um autor no corpo principal de um texto, uma vez que relatos orais, etiquetas documentais e outros meios podiam ser usados ​​para identificar o autor, os autores dos evangelhos mostraram interesse em se identificarem mesmo no corpo principal dos seus textos (João 21:24, Atos 16:10).

- No início do século II, Papias demonstra interesse na autoria dos evangelhos, nomeia os autores de pelo menos três dos quatro evangelhos e cita uma fonte anterior que ele chama "o ancião" (provavelmente o apóstolo João) demonstrando interesse na autoria dos evangelhos e nomeando também um dos autores (em Eusébio, História da Igreja, 3:39). Tanto Papias como o ancião que ele cita estavam vivos e ativos nos círculos cristãos do século I, e estavam interessados ​​na autoria dos evangelhos e nomearam os autores.

- O cristianismo não era um sistema filosófico de ideias que estava a ser promovido independentemente de figuras de autoridade. Pelo contrário, era um sistema baseado na autoridade de indivíduos com nome, começando com Jesus e prosseguindo para os apóstolos e outros indivíduos que eram nomeados (Mateus 10:1-3, Marcos 3:13-19, Efésios 2:20, etc.). O evangelho de Lucas abre com uma referência à importância das testemunhas oculares (1:2), um conceito que requer distinção entre fontes (diferenciando entre aquelas que eram testemunhas oculares e aquelas que não eram), o que incluiria a distinção entre os autores de fontes escritas.

- A ampla aceitação das atribuições de autoria tradicionais na antiguidade, incluindo entre fontes heréticas e fontes que nem sequer se diziam cristãs, faz muito mais sentido se as atribuições de autoria se tivessem originado num período primitivo. Se os evangelhos tivessem inicialmente circulado anonimamente, esperaríamos uma combinação de anonimato e autores nomeados mais tarde, e esperaríamos que os nomes citados na nomenclatura dos autores variassem e variassem muito. Não é isso o que observamos.

Para muitos académicos (especialmente Ehrman), é deliberadamente enganoso o uso de um significado altamente técnico de "anónimo". Ou seja, que o nome não aparece no texto. Nesse sentido, os evangelhos ainda hoje circulam anonimamente. Mas obviamente não é isso o que a maioria das pessoas pensa que “anónimo” significa. Elas pensam equivocadamente que ninguém sabia quem os escreveu por um longo tempo.

sábado, 23 de junho de 2018

Tu és fiel, Senhor



Tu és fiel, Senhor, nosso Pai celeste:
Pleno poder aos Teus filhos darás.
Nunca mudaste: Tu nunca faltaste:
Tal como eras, Tu sempre serás.

Flores e frutos, montanhas e mares,
Sol, lua, estrelas no céu a brilhar:
Tudo criaste na terra e nos ares.
Todo o Universo vem pois Te louvar!

Refrão

Tu és fiel, Senhor! Tu és fiel, Senhor!
Dia após dia, com bênçãos sem fim,
Tua mercê me sustenta e me guarda.
Tu és fiel, Senhor, fiel a mim.

sábado, 2 de junho de 2018

Uma breve introdução ao Design Inteligente. O que está em causa?


A IRREDUZÍVEL COMPLEXIDADE DA VIDA 

Num artigo publicado na revista Science há mais de quatro décadas, Michael Polanyi chamava a atenção sobre a semelhança formal entre a complexidade das máquinas feitas pelo homem e os processos vitais. Em ambos os casos, existe uma diversidade de partes que interagem entre si.

"A estrutura das máquinas e o seu funcionamento é assim formado pelo homem, embora os seus materiais e as forças que as operam obedeçam às leis da natureza inanimada. Ao construir uma máquina e fornecê-la com energia, aproveitamos as leis da natureza que trabalham no seu material e na energia que a impulsiona e as fazemos servir o nosso propósito... Assim, a máquina em conjunto funciona sob o controle de dois princípios diferentes. O superior é o princípio do desenho da máquina, e este aproveita o inferior, que consiste nos processos físico-químicos nos quais se baseia a máquina".


(Polanyi, M. Life´s irreducible structure. Science 160: 1308-1312, 1968; página 1308).


São precisamente os limites que a máquina impõe à forma em que nela podem operar as leis naturais o que a torna útil. Igualmente, as leis naturais não suspendem as suas operações nos sistemas biológicos, mas existe neles um princípio superior de organização que aproveita estas leis. Assim, a existência dos ácidos nucleicos sem dúvida obedece a leis químicas, mas neles encontra-se um vasto conteúdo de informação cuidadosamente especificada que não poderia existir só pela operação das leis químicas.


"Suponha-se que a estrutura real de uma molécula de DNA fora devida ao facto das ligações entre as suas bases serem muito mais fortes do que seriam para qualquer outra distribuição de bases; então tal molécula de DNA não teria conteúdo informativo ... Podemos notar que tal é realmente o caso de uma molécula comum. Uma vez que a sua estrutura ordenada é devida a um máximo de estabilidade, correspondente a um mínimo de energia potencial, o seu ordenamento carece da capacidade de funcionar como um código... À luz da atual teoria da evolução, a estrutura codificada do DNA deve ser assumida como tendo surgido por uma sequência de variações ao azar estabelecida por seleção natural. Mas este aspecto evolutivo é irrelevante aqui; qualquer que seja a origem de uma configuração de DNA, ela pode funcionar como código somente se a sua ordem não for devida às forças da energia potencial... Vimos que a fisiologia interpreta o organismo como uma complexa rede de mecanismos, e que um organismo é - como uma máquina - um sistema sob controle dual. A sua estrutura é a de uma condição de contorno que aproveita as substâncias físico-químicas do organismo, ao serviço das funções fisiológicas ... E posso acrescentar que o DNA é tal tipo de sistema, já que todo o sistema que traz informação está debaixo de controle dual, pois qualquer sistema deste tipo restringe e ordena, ao serviço do transporte da sua informação, recursos extensos de particulares que de outro modo seriam abandonados ao azar, e portanto age como uma condição de contorno" 


(Polanyi, l.c., página 1309).


Precisamente, a investigação bioquímica encontrou, repetidamente, sistemas cuja complexidade intrínseca e interdependência entre as suas partes desafia todo o intento de imaginá-los como o produto de uma evolução gradual a partir de sistemas mais simples. 


A força deste argumento foi percebida por George C. Williams, um dos originadores da teoria de seleção de genes popularizada por Richard Dawkins no seu livro O gene egoísta. Não obstante, Williams posteriormente declarou:


"Os biólogos evolucionistas não se deram conta de que trabalham com dois domínios mais ou menos incomensuráveis: o da informação e o da matéria ... Estes dois domínios nunca de forma alguma podem ser reunidos pelo que habitualmente se designa por ‘reducionismo’ ... O gene é um bloco de informação, não um objeto. O padrão de pares de bases numa molécula de DNA especifica o gene. Mas a molécula de DNA é o meio, não a mensagem. Manter esta distinção entre o meio e a mensagem é absolutamente indispensável para pensar com clareza acerca da evolucão... Em biologia, quando você fala de coisas como genes, genótipos e grupos de genes, está a falar acerca de informação, não de uma realidade física objetiva". 


(Entrevista em John Brockman, Ed. The Third Culture: Beyond the Scientific Revolution. Simon & Schuster, New York, 1995, p. 42-43). 


Quatro exemplos de sistemas complexos 

Poderia abundar-se em exemplos, mas nos limitaremos a citar alguns dos mais óbvios. A propósito do desenvolvimento de órgãos complexos, menciono a extraordinária complexidade da fotossensibilidade, ou propriedade de certas células de responder à luz. Tal processo envolve uma cadeia de reações catalizadas enzimaticamente, variações em concentrações de intermediários, mudanças de permeabilidade iónica nas membranas, libertação de mensageiros químicos e processos de recuperação. 


Um segundo exemplo o constitui o mecanismo de transporte intracelular de proteínas. Quando uma proteína é produzida, tem de ser colocada no sítio correto da célula. Este direcionamento exige um complexo sistema de membranas, passos intermédios, enzimas e cofatores, a maioria dos quais são imprescindíveis, de modo que o processo falha se faltar ou estiver alterado um deles. 


Outro exemplo o constitui o mecanismo de hemostasia, ou detenção da hemorragia de uma ferida, através da coagulação do sangue. Trata-se de uma cascata de reações que envolvem precursores de enzimas, enzimas e cofatores. A falta ou alteração de um só deles ocasiona, por exemplo, a hemofilia. Outros defeitos podem ocasionar o transtorno oposto, uma excessiva coagulabilidade do sangue, de graves consequências. Em consequência, a coagulação deve ser precisamente regulada tanto para que o sangue coagule quando isso é favorável ao organismo, como para que não coagule quando isso é prejudicial. 


Um quarto exemplo o constitui o sistema imunitário, com a sua capacidade de produzir anticorpos contra substâncias estranhas (antígenos) com a consequente destruição, através de outra cascata enzimática chamada complemento, das células estranhas ao organismo. De novo, é essencial que o organismo possua mecanismos de defesa contra as infeções, mas ao mesmo tempo é vital que tais mecanismos não reajam contra as próprias células do hóspede. 


Estes últimos dois sistemas, da coagulação e do complemento caracterizam-se portanto, além da sua complexidade, pela necessidade de uma rigorosa regulação que impeça a sua ativação em condições inapropriadas. Tanto a ativação do mecanismo da coagulação como a de mecanismos imunológicos são imprescindíveis para conservar a vida, mas podem pô-la em perigo se não forem cuidadosamente regulados. 


Chamativamente, não existem explicações adequadas, no quadro neodarwinista, sobre a aparição destes sistemas; a sua existência não pode negar-se, mas o modo em que vieram à existência não está de todo claro. Como sublinha Michael Behe:


"A impotência da teoria darwinista para dar conta das bases moleculares da vida é evidente não só das análises deste livro, mas também da ausência completa, na literatura científica profissional, de quaisquer modelos detalhados pelos quais poderão ter-se produzido sistemas bioquímicos complexos... Perante a enorme complexidade que a moderna bioquímica descobriu na célula, a comunidade científica está paralisada. Ninguém na Universidade de Harvard, ninguém nos Institutos Nacionais de Saúde, nenhum membro da Academia de Ciências, nenhum ganhador do prémio Nobel - ninguém em absoluto consegue dar um relato detalhado de como o cílio [complexo órgão motor], ou a visão, ou a coagulação do sangue, ou qualquer processo bioquímico complexo pode ter-se desenvolvido ao modo darwiniano. Mas estamos aqui. As plantas e os animais estão aqui. Os sistemas complexos estão aqui. Todas estas coisas chegaram aqui de alguma maneira; se não ao modo darwiniano, como?" (Behe MJ. Darwin's Black Box. The biochemical challenge to evolution New York, The Free Press, 1996; página 187).


Desenho sem desenhador? 

O argumento do desenho, de longa data, foi apresentado nos tempos modernos por William Paley na sua Teologia Natural e foi ridicularizado por décadas pelos partidários do dogma evolutivo. Talvez a mais conhecida tentativa seja a de Richard Dawkins no seu O relojoeiro cego. Este cientista britânico explica que pode considerar-se um ateu intelectualmente satisfeito graças a Darwin e define a biologia como o estudo de coisas complicadas que dão a impressão, ou melhor criam a ilusão, de terem sido criadas com um propósito. 


"O problema do biólogo é o problema da complexidade. O biólogo tenta explicar o funcionamento, e o início da existência, de coisas complexas em termos de coisas mais simples... 
A seleção natural é o relojoeiro cego, cego porque não pode ver o que há por diante, não planeja as consequências, não tem propósito em vista. No entanto, os resultados vivos da seleção natural nos impressionam avassaladoramente com a aparência de desenho e planificação" 

(Richard Dawkins, The Blind Watchmaker, 3rd Ed. W.W. Norton, New York, 1996, página 15,21) 

Paley defendia a noção de desenho com base na presumida perfeição da criação, e os seus adversários foram capazes de assinalar muitas imperfeições, verdadeiras ou supostas. No entanto, a noção de desenho não traz implícita a ideia de perfeição. Podemos perceber desenho quando num sistema ou objeto se deteta uma disposição deliberada, significativa e inteligente das suas partes. Uma tosca ferramenta neolítica é considerada prova de desenho inteligente em arqueologia. Além disso, deve sublinhar-se que a ideia de desenho inteligente não contradiz de modo algum a operação das leis naturais, nem nos diz nada diretamente sobre a identidade do desenhador.

A deteção de desenho inteligente é usada continuamente pelos arqueólogos para a deteção de restos de atividade humana. Mais ainda, se projetos como o da "deteção de inteligência extraterrestre" (SETI) detetasse uma mensagem (informação) proveniente do espaço exterior, por mais simples que esta fosse, isso seria considerado evidência em favor da existência de inteligência extraterrestre. De igual modo, é difícil evitar a conclusão de que a deteção de desenho inteligente nos sistemas biológicos implica que, conforme a nossa experiência, a ideia de um desenhador está longe de ser absurda, ainda que não soubéssemos nada acerca da sua identidade. De facto, fora da biologia tal como esta é entendida pelos neodarwinistas, a existência de um verdadeiro desenho não explicável pela simples operação de forças físicas é considerada evidência irrefutável da existência de um desenhador inteligente.

É a seleção natural um fracasso?

A crítica anterior sobre a validade da seleção natural como mecanismo da evolução não implica de modo algum negar a realidade da seleção natural; mas salienta que é altamente improvável que tal mecanismo possa ser responsável pela diversidade de espécies.

A seleção natural parece ser um importante mecanismo na microevolução. Um exemplo famoso é o das populações da chamada borboleta do abedul (Biston betularia). Este inseto é normalmente de cor clara, embora ocasionalmente surgem, por mutação, exemplares escuros. Antigamente tais exemplares escuros eram eliminados rapidamente pelos predadores, pois a sua cor os tornava muito visíveis sobre o tronco das árvores. Quando a revolução industrial em Inglaterra fez que as árvores se escurecessem pela fuligem, a população de Biston tornou-se predominantemente escura. Em tempos recentes, as medidas ecológicas clarificaram os troncos, e os insetos claros voltaram a predominar. 

É importante observar 1) que havia borboletas claras e escuras durante todo o período, e até hoje e 2) que o predomínio de uns exemplares ou outros não envolve o surgimento de uma nova espécie. Apesar disso, muitos pensam que estes mecanismos seletivos são similares aos envolvidos na especiação. No entanto, o que é verdade numa escala não necessariamente o é em outra. Por exemplo, a temperaturas de muitos milhares de graus, como as existentes no interior das estrelas, produzem-se reações termonucleares. Os fenómenos de combustão também elevam a temperatura. No entanto, não se podem produzir reações termonucleares com um fogareiro ou um forno de padaria. A escala é muito diferente. O facto da seleção natural modificar o equilíbrio de populações, por exemplo, de bactérias resistentes a um antibiótico, não implica que possa transformar umas espécies em outras, nem que seja o mecanismo responsável pela fantástica diversidade dos seres vivos.

De facto, ainda que não o digam nos seus tratamentos do tema dirigidos à opinião pública, a comunidade científica evolucionista está dolorosamente consciente destes problemas. 

"Passou aproximadamente meio século desde que foi formulada a síntese neodarwiniana. Realizou-se muita investigação dentro do paradigma que ela define. No entanto, os êxitos da teoria limitam-se às minúcias da evolução, como mudanças adaptativas na cor das borboletas; ao passo que tem notavelmente pouco que dizer sobre as perguntas que nos interessam mais, como por exemplo, de como chegou a haver borboletas em primeiro lugar" (Ho, M.W.; Saunders, P. Beyond Neo-Darwinism - An epigenetic approach to evolution. Journal of Theoretical Biology 78: 589, 1979). 

Os artrópodes, invertebrados de patas articuladas que incluem crustáceos, quelicerados, miriápodes e insetos, constituem mais de metade de todas as espécies conhecidas. No entanto, 

"...para lá desta rudimentar taxonomia, há pouco acordo sobre como se relacionam os artrópodes, existentes e extintos ... Permanece a pergunta evolucionista central: Como, em termos tanto de padrão como de processo, veio à existência a incomparável diversidade e persistência dos artrópodes? ... Os estudos de morfologia e embriologia comparativa somente polarizaram ainda mais o debate... por agora, os dados moleculares são muito escassos, e a diversificação demasiado rápida e antiga para permitir a reconstrução de filogenias não ambíguas... Mesmo se a filogenia historicamente correta pudesse ser decifrada..., só teríamos a metade de uma resposta à pergunta evolucionista central. Permaneceria o desafio de reconciliar o padrão filogenético com o processo evolutivo". 

(Grosberg, R.K.: Out on a limb: Arthropod origins. Science 250: 632-633, 1990; ver também Lemarchand, F. Les premiers insectes. La Recherche 296: 85, Mar. 1997).

segunda-feira, 19 de março de 2018

Poema para Galileo


Estou olhando o teu retrato, meu velho pisano,
aquele teu retrato que toda a gente conhece,
em que a tua bela cabeça desabrocha e floresce
sobre um modesto cabeção de pano.
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da tua velha Florença.
(Não, não, Galileo! Eu não disse Santo Ofício.
Disse Galeria dos Ofícios.)
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da requintada Florença.
Lembras-te? A Ponte Vecchio, a Loggia, a Piazza della Signoria…
Eu sei… eu sei…
As margens doces do Arno às horas pardas da melancolia.
Ai que saudade, Galileo Galilei!

Olha. Sabes? Lá em Florença
está guardado um dedo da tua mão direita num relicário.
Palavra de honra que está!
As voltas que o mundo dá!
Se calhar até há gente que pensa
que entraste no calendário.

Eu queria agradecer-te, Galileo,
a inteligência das coisas que me deste.
Eu,
e quantos milhões de homens como eu
a quem tu esclareceste,
ia jurar - que disparate, Galileo!
- e jurava a pés juntos e apostava a cabeça
sem a menor hesitação -
que os corpos caem tanto mais depressa
quanto mais pesados são.

Pois não é evidente, Galileo?
Quem acredita que um penedo caia
com a mesma rapidez que um botão de camisa ou que um seixo da praia?
Esta era a inteligência que Deus nos deu.

Estava agora a lembrar-me, Galileo,
daquela cena em que tu estavas sentado num escabelo
e tinhas à tua frente
um friso de homens doutos, hirtos, de toga e de capelo
a olharem-te severamente.
Estavam todos a ralhar contigo,
que parecia impossível que um homem da tua idade
e da tua condição,
se tivesse tornado num perigo
para a Humanidade
e para a Civilização.
Tu, embaraçado e comprometido, em silêncio mordiscavas os lábios,
e percorrias, cheio de piedade,
os rostos impenetráveis daquela fila de sábios.

Teus olhos habituados à observação dos satélites e das estrelas,
desceram lá das suas alturas
e poisaram, como aves aturdidas - parece-me que estou a vê-las -,
nas faces grávidas daquelas reverendíssimas criaturas.
E tu foste dizendo a tudo que sim, que sim senhor, que era tudo tal qual
conforme suas eminências desejavam,
e dirias que o Sol era quadrado e a Lua pentagonal
e que os astros bailavam e entoavam
à meia-noite louvores à harmonia universal.
E juraste que nunca mais repetirias
nem a ti mesmo, na própria intimidade do teu pensamento, livre e calma,
aquelas abomináveis heresias
que ensinavas e descrevias
para eterna perdição da tua alma.

Ai Galileo!
Mal sabem os teus doutos juízes, grandes senhores deste pequeno mundo
que assim mesmo, empertigados nos seus cadeirões de braços,
andavam a correr e a rolar pelos espaços
à razão de trinta quilómetros por segundo.

Tu é que sabias, Galileo Galilei.

Por isso eram teus olhos misericordiosos,
por isso era teu coração cheio de piedade,
piedade pelos homens que não precisam de sofrer, homens ditosos
a quem Deus dispensou de buscar a verdade.

Por isso estoicamente, mansamente,
resististe a todas as torturas,
a todas as angústias, a todos os contratempos,
enquanto eles, do alto incessível das suas alturas,
foram caindo,
caindo,
caindo,
caindo,
caindo sempre,
e sempre,
ininterruptamente,
na razão directa do quadrado dos tempos.


António Gedeão (1906-1997)

sexta-feira, 2 de março de 2018

O "Não" Problema do Mal


O problema do mal geralmente assume a forma de um tétrade inconsistente:

i) Deus é omnipotente

ii) Deus é omnisciente

iii) Deus é benevolente

iv) O mal existe

Este problema costuma ser usado por ateus como argumento contra a existência de Deus. Um ateu tenta mostrar que estes pontos são mutuamente inconsistentes, gerando assim um dilema para o cristão. Para evitar a inconsistência, um cristão tem de prescindir de pelo menos uma das proposições. Se, no entanto, (i-iii) não são negociáveis, então o seu sistema de crenças falha. Como é um sistema de tudo ou nada, se for inconsistente em qualquer ponto, então tem que abandonar-se o todo.

Mas um problema com o argumento do mal é que ele ataca uma versão muito abstrata de teísmo. Algo derivado da teologia filosófica. Teísmo clássico ou teologia do ser perfeito.

Normalmente, o argumento do mal não é formulado em referência a uma religião histórica viva, como o judaísmo do AT ou o cristianismo do NT.

Por exemplo, seria muito mais difícil mostrar que o argumento do mal refuta a existência de Yahweh, uma vez que Yahweh não é "benevolente" no sentido em que os ateus normalmente definem a benevolência ao formular o argumento do mal. Na verdade, muitos incrédulos rejeitam o teísmo bíblico porque pensam que Yahweh, Jesus e/ou Deus, o Pai, não é benevolente como eles veem a benevolência. Eles ficam melindrados com várias ações divinas, ordens e proibições na Escritura.

Mas aonde isso leva o argumento do mal? Se, pela sua própria admissão, o teísmo bíblico não se conforma com as suas noções preconcebidas de benevolência, então a existência do mal está em consonância com a existência de uma Deidade como essa.

Além disso, a existência do mal é uma pressuposição necessária do teísmo bíblico. Se vivêssemos num mundo desprovido de mal moral e natural, a ausência, em vez da presença do mal, falsificaria a descrição bíblica da realidade. A história da Bíblia está repleta de mal. A salvação e o juízo escatológico são o remédio final.

sábado, 3 de fevereiro de 2018

OS FINAIS DO EVANGELHO DE MARCOS


Os manuscritos gregos e de antigas versões (traduções) do Novo Testamento apresentam cinco finais diferentes para o Evangelho de Marcos, a saber:

1. Alguns finalizam no versículo 16:8 e simplesmente omitem os vv. 9-20: “Elas saíram fugindo do sepulcro, porque estavam possuídas de temor e assombro; e não disseram nada a ninguém, porque tinham medo”. São assim os códices Sinaítico e Vaticano, L*, o manuscrito k da Antiga Versão Latina, a Siríaca sinaítica, e diversos manuscritos das versões antigas arménia, georgiana e etíope. Eusébio e Jerónimo notaram que a maioria dos manuscritos gregos que conseguiram examinar careciam do final longo. Aparentemente, nem Clemente nem Orígenes conheceram tal final. Finalmente, ainda alguns dos manuscritos que o possuem, apresentam observações ou marcas dos escribas indicando que se trata de uma adição.

2. Outros acrescentam o seguinte texto: “Mas [as mulheres] relataram resumidamente a Pedro e aos que estavam com ele tudo quanto lhes tinha sido dito. E depois disto o próprio Jesus enviou por meio deles, do Oriente ao Ocidente, a sagrada e imperecível proclamação da salvação eterna”. Entre eles apenas este versículo no códice Bobbiensis (k) do século IV ou V.

3. Ainda outros intercalam o versículo acima citado antes do final longo (16:9-20) em unciais dos séculos VII ao IX (L, Psi, 099, 0112), alguns minúsculos e cópias de versões antigas.

4. Muitos manuscritos contêm o final longo que inclui os versículos 9-20, alguns com o acréscimo do texto recém-mencionado. É o que se encontra no chamado Textus Receptus, e é atestado pelos unciais A C D L W Delta Sigma Theta 047, pela maioria dos manuscritos minúsculos e da Antiga Latina, da Vulgata, da siríaca curetoniana e Peshitta (“vulgata” siríaca), e da versão copta. Além de outros testemunhos posteriores, Ireneu e Hipólito o conheciam; aparentemente é citado pela Epistula Apostolorum e Taciano o incluiu na sua harmonia ou Diatessaron de finais do século II.

5. Finalmente, existe uma versão ampliada do final “longo” que imediatamente depois do versículo 14 (“..porque não haviam crido nos que o tinham visto já ressuscitado”) acrescenta: “E eles se desculparam dizendo «Esta era de iniquidade e incredulidade está debaixo de Satanás, que não permite que a verdade e o poder de Deus prevaleçam sobre a impureza dos espíritos. Portanto, revela agora a tua justiça». Assim falaram a Cristo. E Cristo lhes respondeu, «O fim de anos do poder de Satanás se cumpriu, mas outras terríveis coisas se aproximam. E por aqueles que pecaram eu fui entregue à morte, para que possam voltar à verdade e não pecar mais; para que possam herdar a glória espiritual e incorruptível de justiça que está no céu»”. Esta adição foi notada por Jerónimo, e é atestada pelo códice W adquirido em 1906 por Charles L. Freer, que data da última parte do século IV ou princípios do seguinte.

É claro que, nem todos estes finais têm o mesmo peso. É extremamente improvável que Marcos, com seu estilo simples, tenha escrito algo tão altissonante como “a sagrada e imperecível proclamação da salvação eterna”, ou “a glória espiritual e incorruptível de justiça”, expressões que delatam influências helenistas posteriores. Este facto, somado ao número e idade dos testemunhos, praticamente isenta de maiores considerações os finais listados (2) (3) e (5).

Apesar de alguns terem sustentado – por exemplo Lohse, p. 144-145 - que o Evangelho finalizava originalmente no versículo 8, isto também é pouco provável, em parte porque constitui um final anticlimático, muito pouco apropriado para concluir “o evangelho de Jesus Cristo” (1:1).

Mais importante é a evidência fornecida pela última cláusula do versículo 8, “porque tinham medo” (grego efobounto gar). Metzger nota que “de um ponto de vista estilístico, terminar uma frase grega com a palavra gar é extremamente incomum e raríssimo – só se acharam relativamente poucos exemplos em toda a vasta gama de obras literárias gregas, e não se achou nenhum caso no qual gar se encontre no final de um livro. Mais ainda, é possível que no versículo 8 Marcos use o verbo efobounto para significar «estavam assustadas com...» algo (como o faz em quatro das outras aparições deste verbo no seu Evangelho [ver Marcos 9:32, 11:32, 12:12 e especialmente 11:18, “efobounto gar auton”, eles o temiam]). Em tal caso, obviamente é preciso algo para concluir a frase” (p. 228). Em suma, estes factos sugerem que falta algo do que Marcos originalmente escreveu, e que tal ausência motivou mais tarde a aparição de diferentes conclusões.

A versão que aparece nas nossas Bíblias como os versículos 16:9-20 também não parece a original, apesar de ser atestada por muitos manuscritos. Para começar, há uma transição muito abrupta entre o v. 8 e o 9; o sujeito do primeiro versículo (8) são as mulheres, enquanto Jesus é obviamente o sujeito no segundo (9). No entanto, no texto grego o sujeito está tácito: “E tendo ressuscitado cedo no primeiro [dia] da semana, apareceu primeiro a Maria a Madalena...” Este facto não é evidente em muitas versões em português porque os tradutores incluem habitualmente o nome de Jesus nesta frase.

Em segundo lugar, no v. 9 se fala de Maria Madalena como se não tivesse sido mencionada antes, quando já se falou dela no relato marcano da crucificação, sepultura e ressurreição. O resto das mulheres desaparece da cena, ainda que tivessem sido comissionadas para relatar a ressurreição no v. 7. No mesmo versículo o anjo anuncia que verão Jesus na Galileia, mas as manifestações do Ressuscitado dão a impressão de ocorrer na área de Jerusalém; pelo menos, não é mencionada a Galileia.

O estilo destes versículos difere também da linguagem habitual de Marcos. Das 101 palavras gregas dos versículos 9-20, há 75 significativas (excluídos conjunções, artigos e nomes próprios), das quais 15 não aparecem no resto do Evangelho e 11 que aparecem, usam-se com um sentido diferente. Mesmo considerando a diferença do tema, a linguagem se apresenta prima facie como não própria de Marcos.

Também não há no resto do segundo Evangelho nenhuma recriminação tão severa como a indicada no versículo 14. Por outro lado, a promessa de imunidade diante das serpentes e do veneno não só é alheia a Marcos, mas aos outros três evangelhos, e ao resto do Novo Testamento.

Há quem pense que os versículos 9-20 são uma tentativa de harmonizar o relato de Marcos com os dos outros Evangelhos canónicos; são desta opinião por exemplo Bruce e Linnemann (citado por Kümmel). Por outro lado tal “conclusão foi contestada, com muito acerto” (Leon-Dufour), por Joseph Hug, numa tese doutoral publicada em 1978. Esta análise literária indicaria que os versículos 9-20 seriam um acréscimo original que deve datar-se entre finais do século primeiro e antes de meados do segundo (Metzger, p. 297). O acréscimo teria tido como propósito fornecer instruções missionárias à comunidade cristã de fala grega com tendências carismáticas. Deste ponto de vista, Marcos 16:9-20 seria um testemunho muito primitivo proveniente da Igreja subapostólica.

Em suma, considerada toda a evidência, aparentemente o texto autêntico e original de Marcos, tal como este Evangelho foi conservado, termina em 16:8. Portanto, não é prudente basear doutrinas nos versículos 9-20.


Bibliografia

Bruce, Frederick Fyvie: Answers to questions. The Paternoster Press, 1972 (p. 155).

Kümmel, Werner Georg. Introduction to the New Testament. Rev. English Ed. Trad. Howard Clark Kee. Nashville: Abingdon Press, 1975 (p. 98-101).

Ladd, George Eldon. Crítica del Nuevo Testamento: Una perspectiva evangélica. Trad. Moisés Chávez. El Paso: Mundo Hispano, 1990 (p. 56-59).

Leon-Dufour, Xavier. Los evangelios sinópticos. Em Augustin George e Pierre Grelot (Dirs.), Introducción Crítica al Nuevo Testamento. Trad. J. Cabanes e M. Villanueva. Barcelona: Herder, 1982 (pp. 293-295).

Metzger, Bruce M. The text of the New Testament: Its transmission, corruption and restoration, 3ª Ed. New York: Oxford University Press, 1992 (p. 226-228, 296-297).

Wessel, Walter W.. Mark. Em Frank E. Gaebelein (Gen.Ed.), The Expositor’s Bible Commentary. Grand Rapids: Zondervan, 1984 (8:791-793).
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