Alguns jovens protestantes ficam apaixonados pelo
tomismo. O que torna o tomismo tão atraente?
1. Uma motivação é o apelo das redes sociais. Uma
comunidade virtual na qual se pode alcançar status social fazendo comentários para impressionar outros. O tomismo permite ser um exibicionista intelectual nas redes
sociais.
2. Numa frente diferente, o tomismo é atraente para
alguns porque é muito enciclopédico. Ele tem respostas prontas para uma série
de questões, desde metafísica e epistemologia até à ética. O protestantismo não
desenvolveu nada equivalente.
O tomismo tem estas categorias expeditas, gavetas em que
se pode meter coisas e sai a resposta, a saber, forma/matéria,
essência/existência, substância/acidente, eficiente/formal/material, causas
finais.
Como uma máquina de panquecas. Despeja-se a massa dentro e saem
panquecas. A máquina determina o formato que a massa terá.
Claro, isso é apenas uma virtude se a realidade for em
formato de panqueca.
3. Tomás de Aquino foi um grande teólogo filosófico, um
grande teólogo sistemático, bem como um influente eticista, teórico político,
etc. Portanto, há alguma justificação para o interesse nele. Dito isso, o
interesse por Tomás de Aquino muitas vezes torna-se míope. E isso traz
problemas. Por exemplo:
i) A filosofia e a teologia filosófica não terminaram
com Tomás de Aquino, logo não há nenhuma boa razão para que ele seja o paradigma
padrão. Isso leva à negligência de filósofos posteriores e teólogos filosóficos
fora da tradição tomista. Especialmente para os protestantes, não deve haver nenhuma
presunção de que a ética, a metafísica e a epistemologia tomista seja o melhor sistema. Por exemplo, a filosofia frequentemente usa modelos e analogias
alicerçados na lógica, na matemática e na ciência. Avanços na lógica, na matemática
e na ciência podem levar a avanços na análise filosófica. Neste aspecto, o
tomismo tem recursos conceptuais antiquados e anacrónicos.
É certo que o tomismo tem sido atualizado, mas, como a
adaptação de um carro antigo, chega um ponto em que tem que se parar de ajustar
a tecnologia do carburador e criar algo do zero.
ii) Quando deixado por sua conta, Tomás de Aquino é um
pensador bastante claro. No entanto, ele é antes de tudo um clérigo leal. Seu
dever é defender o dogma católico medieval.
Isso significa que ele está preso a coisas que são
difíceis de defender. Ele tem que apresentar defesas engenhosas do dogma
recebido. Isso resulta em falta de clareza. Ele torna-se pouco claro porque
traça distinções ad hoc para defender tudo o que seja dogma. Ele não dá
as cartas. Ele joga com as cartas que recebeu.
iii) Outro problema diz respeito à gestão do tempo: a
vida é curta, os livros são caros, o dia tem apenas 24 horas. O tempo investido
no tomismo é tempo retirado de outros estudos. Isso não significa que quem tem
interesse por filosofia deva ignorar o tomismo, mas há, igualmente, outras
coisas que não devem ignorar-se. Trata-se de uma questão de prioridades.
Por exemplo, há um lugar importante para a cristologia
filosófica. Mas esse não é o ponto de partida adequado. O que sabemos sobre
Jesus é baseado na revelação histórica. O ponto de partida adequado é a
teologia exegética, não a teologia filosófica ou a teologia histórica. Dito de outra
forma, a teologia filosófica deverá partir da teologia exegética. No caso da
cristologia, a cristologia do NT é o fundamento.
Se alguém pretende ler boas obras sobre
cristologia, comece com monografias exegéticas de estudiosos como Richard
Bauckham, Gordon Fee, Simon Gathercole, Larry Hurtado e Sigurd Grindheim. Isso
fornece a matéria-prima para a análise e modelação filosófica.
A cristologia filosófica que não está firmemente
fundamentada na cristologia do NT é apenas uma incursão na história das ideias,
brincar com ideias, como algumas ideias se relacionam com outras ideias. Nada
disso tem qualquer base na realidade de quem Jesus realmente é. Ela torna-se
idolatria intelectual: adoração das nossas próprias mentes.
4. Faz sentido para um católico piedoso começar com o
dogma da igreja. Ele acha que a Madre Igreja tem a interpretação correta do NT
da pessoa e da obra de Cristo. Então esse é o ponto de partida dele. E isso é
lógico, dado a premissa incorreta.
Mas essa não é uma premissa dos protestantes. A menos que comecemos com verdades reveladas sobre Jesus, o que acreditamos é
apenas encenação.
Por exemplo, se alguém começar com Tomás de Aquino, fica a entender as duas
naturezas de Cristo em termos de antropologia tomista (p. ex. hilomorfismo) e teologia tomista (p. ex. simplicidade divina, actus
purus, trinitarianismo latino). Dessa forma, o que faz é substituir a
cristologia do NT por um simulacro.
Ironicamente, alguns jovens protestantes são mais
católicos do que o catolicismo. Existem filósofos católicos como Nicholas
Rescher, Bas van Fraassen, Michael Dummett e Dagfinn Føllesdal que não
compartilham a paixão deles pelo tomismo. Sem falar em ordens religiosas
inteiras (jesuíta, franciscana) que estão em desacordo com o tomismo.
O cardeal Newman adotou uma abordagem muito diferente
da epistemologia religiosa de Aquino. Da mesma forma, Bento XVI estava, pelo que
sei, muito mais sintonizado com os seus padres da igreja favoritos do que com
Aquino. Aliás, quão central foi Tomás de Aquino para a filosofia/teologia de
João Paulo II? Urs von Balthasar não era o seu teólogo favorito?
Há também filósofos católicos, como Alexander
Pruss, que são bastante ecléticos. Ele defende o argumento cosmológico
leibniziano e não tem problemas em combinar insights aristotélicos e
leibnizianos sobre mundos possíveis.
O facto é: os verdadeiros filósofos fazem algum
juízo independente na sua avaliação do tomismo. É isso que os torna pensadores
críticos. Mesmo quando se apropriam do tomismo, eles o peneiram e qualificam.