sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Opiniões antigas e medievais sobre a autoridade papal dentro da igreja


"Dos textos petrinos, Mateus 16:18s é claramente central e tem a distinção de ser o primeiro texto escritural invocado para apoiar as pretensões de primazia dos bispos romanos. Antes de meados do século III, porém, e mesmo depois de tal data, alguns exegetas patrísticos ocidentais, como também orientais (antigos Padres da Igreja que na sua interpretação da Bíblia usaram técnicas críticas) entenderam que por "pedra" Cristo não se referia a Pedro mas a si mesmo ou à fé que Pedro professou. Não obstante, em finais do século IV e V houve uma crescente tendência por parte dos bispos romanos de justificar escrituralmente e de formular em termos teóricos a mal definida preeminência na igreja universal que havia por longo tempo sido adscrita à Igreja Romana e ao seu bispo. Assim, Dámaso I, apesar da existência de outras igrejas de fundação apostólica, começou a chamar a Roma "A sede apostólica". Pela mesma época as categorias da Lei Romana foram tomadas emprestadas para explicar e formular as prerrogativas do bispo romano. O processo de elaboração teórica alcançou o culminar nas opiniões de Leão I e Gelásio I, o primeiro entendendo-se a si mesmo não simplesmente como o sucessor de Pedro mas também o seu representante ou vigário. Ele era o 'indigno herdeiro' de Pedro, possuindo por analogia com a lei romana da herança os poderes plenos que o próprio Pedro tinha tido, que ele [Leão] interpretava como monárquicos, já que Pedro tinha sido investido com o 'principatus' sobre a igreja.

Num nível puramente teórico, não é grande a distância entre as pretensões apresentadas por Leão I e a posição incorporada no decreto de primazia do Vaticano I. Os papas medievais, tais como Gregório VII, Inocêncio III e Inocêncio IV, deixaram claro pela sua prática, bem como pelas suas declarações teóricas o significado preciso de tal plenitude de poder ('plenitudo potestatis') sobre a igreja à qual, segundo alguns eruditos, havia aspirado o próprio Leão I. Nisto foram auxiliados não somente pelos esforços de publicitários como o teólogo e filósofo italiano Aegidius Romanus (m. 1316), que magnificou os poderes monárquicos do papa em termos irrestritos e seculares, mas também pelo desenvolvimento massivo desde finais do século XI, XII e XIII de uma lei canónica altamente romanizada. O 'Decretum' de Graciano (c. 1140), a coleção não oficial de cânones que se tornou o livro de texto fundamental para o estudante medieval de direito canónico, punha grande ênfase na primazia da sede romana, aceitando como genuínos certos cânones que eram obra de falsificadores dos séculos VIII e IX – como dois princípios que o Código de Direito Canónico de 1917 reafirma: «que não pode haver um concílio ecuménico que não seja convocado pelo Romano Pontífice» e que «ninguém pode julgar a Primeira Sede».

A prevalência de tais ideias e a ausência de um desafio formidável às pretensões papais de primazia durante a alta Idade Média explica a ausência de alguma definição conciliar da primazia romana nos grandes concílios gerais 'papais' desse período. Daí que se requereu a (frustrada) tentativa de reunião com a Igreja Ortodoxa no Concílio de Florença em 1439 para induzir a primeira definição conciliar solene da primazia romana. Esta definição foi incluída no decreto de união com os gregos (Laetentur Coeli), e dizia quanto se segue:

«Definimos que a Santa Sede Apostólica e o Romano Pontífice têm a primazia sobre todo o mundo, que o próprio Romano Pontífice é o sucessor de Pedro, príncipe dos Apóstolos, que ele é o verdadeiro vigário de Cristo, cabeça de toda a igreja, pai e mestre de todos os cristãos, e [definimos] que a ele na pessoa de Pedro foi dado por nosso Senhor Jesus Cristo o poder pleno de nutrir, reger e governar a igreja universal; como também está contido nas atas dos concílios ecuménicos e nos santos cânones.»"

Encyclopaedia Britannica, s.v. The Papacy

Acrescenta o autor que este decreto formou a base para a definição promulgada pelo Concílio Vaticano I de 1870 na Constituição Dogmática "Pastor Aeternus".

Em suma, a primazia papal baseou-se em interpretações duvidosas, na ânsia de poder dos bispos romanos, na lei romana pré-cristã (pagã), na ação de propagandistas e em documentos forjados.

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