sábado, 13 de maio de 2017

Giorgio Spini*, sobre a Reforma - 1957


Os homens da Reforma não foram argutos políticos ou clarividentes revolucionários sociais ou apoiantes da liberdade da cultura. Foram terrivelmente ingénuos e simples: acharam que era preciso procurar primeiro o reino dos Céus e que tudo o resto seria acrescentado: não hesitaram em crer uma coisa tão absurda, à vista humana pelo menos, que o grão de mostarda do Evangelho pudesse crescer até se tornar árvore gigante e abrigar debaixo da sua sombra pássaros de todo o género. Nós fomos, até agora pelo menos, mais realistas, mais astutos, mais doutos: procuramos o reino desta terra. A história nos demonstrou que a simples fé da Reforma era capaz de mover montanhas seculares e abater muros mais firmes do que aqueles de Jericó: nos demonstrou ao contrário que a nossa sabedoria serve apenas para levantar frágeis casas expostas a ruir ao primeiro adensar da tempestade e ao primeiro sopro de ventos adversos. Ainda hoje, a tanta distância de séculos, a mensagem da Reforma é sinal de contradição ou de salvação: mensagem de escândalo ou de loucura, como ela suou a primeira vez, na face dos poderes coligados do pontificado romano, do império de Carlos V, da banca dos Fugger. Como há tantos séculos, essa mensagem não nos chega do alto de um trono, nem nos vem imposta com exércitos armados ou tesouros de financeiros. Vem-nos apenas da quebrada voz de um humilde testemunho, desamparado e sozinho diante dos poderes deste mundo, que nos repete: «Não posso fazer de outro modo. Que Deus me ajude».


*Giorgio Spini (1916 -2006) foi um dos mais importantes historiadores italianos do século XX.


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